Crítica: em BRAT, Charli XCX reorganiza sua linguagem altamente diplomada em criar excelsos refrões pop

sexta-feira, 7 de junho de 2024
por Matheus José

É estranho pensar que, na cabeça de muitas pessoas, quando falamos de pop estamos automaticamente falando de composições cuja elaboração desperta, ou deveria quase necessariamente despertar, os habituais sentimentos de emoção. Charli XCX, como sendo uma estrela pop aquém de qualquer predisposição do gênero, sempre fez de suas composições a máxima de sua personalidade.

Capa oficial de "BRAT". Imagem: Divulgação.

Capa oficial de “BRAT”. Imagem: Divulgação.

Ou seja, nenhum de seus materiais chega perto ou tenta convencer o ouvinte a acreditar que está ouvindo uma bíblia pop de forma semelhante ao que nomes como Lady Gaga, Taylor Swift e até Lorde causam em termos de impressão quando se é citada a relação de autoria. A maior conquista de Charli é seu desleixo, pelo menos o desleixo que ela cria propositalmente como parte de sua estética.

Talvez a única vez em que ela realmente mergulhou de cabeça na obsessão pop, de aderir a maneirismos — ainda que falsamente — foi em seu último álbum, CRASH, de 2022, também visto como resultado de sua busca constante para se convencer de ser uma estrela pop. E, por um momento, ela até conseguiu: o álbum teve um sucesso surpreendente nas paradas musicais.

Em BRAT, porém, consciente de suas capacidades, ao mesmo tempo em que tenta expor sua personalidade imperturbável, nem aí para polêmicas, Charli reafirma o que de melhor tem à sua disposição: refrões pop revestidos de um sincretismo vanguardista que abrange diferentes posições demográficas. Sua aderência eletrônica pode ser percebida, como uma expansão clube, desde o single “Von Dutch”, uma cusparada sem fim de pressão e iconicidade decupada por arranhões sintéticos. A mesma precisão na perfuração do solo para garantir estabilidade repetível é sinalizada em “Back to, back to, back to, back to you”, de “B2b”.

Quando a aposta dobra, e notamos a manutenção de um par comum, a simplicidade também surte efeito (“Sympathy is a knife”, “Everything is romantic” e “I think about it all the time”). Mas é, em todos os momentos, uma exemplificação das melodias e ganchos que Charli pensa como uma exploração das suas experiências, ou mesmo a adoção de uma externalização pragmática de seus temas emocionais.

Na verdade, nenhum aspecto referente à construção de suas faixas atuam como novidade. BRAT tem resquícios de Pop 2, acena para True Romance e repousa sua ferocidade em how i’m feeling now. Mas é, acima de tudo, uma marca do presente: Charli XCX sabe que precisava retomar a força de desafiar a si mesma, de provocar e imprimir satisfação. 

É por isso que o verde que estampa a capa do álbum, promovendo um minimalismo incômodo, foi, propositalmente, pensado para causar as reações que causou, isso inclui os virais ao longo da semana. É brilhante, mas também arriscado, como se a Charli XCX do Vroom Vroom EP, jogada nas sombras da PC Music, fosse agora, de uma vez por todas, compreendida.


Nota: 9/10

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